Isabel faz o seu relato, tem 33 anos, e vive em Viseu
Olá pessoal,
O meu nome é Isabel Dias, tenho 33 anos, sou de Viseu e tenho LES desde 2009.
A minha história é recente, sem muito para contar depois de ler outros testemunhos, mas vou contar um pouco…
Estou eu na entrada dos 30 anos com muitos sonhos, ilusões e algumas desilusões à mistura.
Não sei precisar datas certas, mas finais de 2008 começo com algumas dores estranhas, um cansaço que não conseguia explicar. Alias, explicava-as (na minha ignorância) com a falta de sono, más e desajustadas posições (que todos nos cometemos, mesmo tendo consciência delas), o facto de andar sob stress no trabalho…
As dores em algumas articulações ou “dobradiças” como tenho hábito de lhes chamar, estavam a ficar “empenadas”, na brincadeira dizia que era da idade. E como nunca gostei de ir ao médico, lá fui deixando arrastar. As dores andavam a saltitar de um lado para o outro: ora a mão direita, ora a mão esquerda, ora o pulso, ora os joelhos, ora os pés, ora os tornozelos e andavam elas de um lado para o outro, no máximo dos máximos 2 dias seguidos, nunca mais do que isso.
Não liguei, seria demasiado “mariquinhas” se não aguentasse estas simples dores, haviam de passar… dizia eu… é o que dá a mania de querer ser-se forte. Este é o sentimento que tenho dentro de mim, depois também aliado à falta de tempo que a própria vida nos obriga a ter, estamos tão absorvidos em projectos de vida na área profissional (principalmente), que não paramos para nos escutar-mos a nós próprias, e também não sabemos (eu) como interpretar esses sinais.
Novo ano começava – 2009 – e eu estava a entrar nela em cheio: 2 quistos sebáceos no rosto do lado direito, claro que já estava a dar sinais havia algum tempo, mas como não tenho “tempo a perder”, decidem chamar mesmo atenção e inflacionam, e o meu rosto fica uma vergonha, inchado, o olho esquerdo mal conseguia abrir, lá vai a Isabel para o hospital. Dias depois as minhas amigas amigdalites decidem dar o ar da sua graça, lá volta a Isabel a visitar as urgências, pois não estava a conseguir comer, este para mim é o ponto máximo, sem comer e com fome, para mim não dá, pois é das coisas que mais gosto de fazer.
Tendo em conta que até então (os 30) nunca tive nada de especial a registar ao nível da saúde, tirando amigdalites e sinusite (nada de muito grave). Nem a mim, nem a meus familiares, graças a Deus. Portanto problemas de saúde eram-me completamente alheios… nomes de doenças? Poucas… Causas? Nenhumas… Nomes de medicamentos? Paracetamol e pouco mais.
Foi então no inicio do novo ano (que já estava a ser muito interessante) que as dores começaram-se a intensificar e comecei a deixar de conseguir explicar as noites mal dormidas, queria caminhar e estava com dificuldades, porquê? O que se estava a passar??? Tenho 1,70m e 59kg (peso esse que deixou de ser normal dentro de pouco tempo), sempre tive o passo largo e caminhava rápido, eu é que tinha que esperar os outros para me acompanharem nas caminhadas, a coisa começou a ficar diferente, quando dou por mim, estou eu aos berros para irem mais devagar que não consigo ir mais rápido… pensei eu: calma lá, alguém mais alto do que eu tudo bem, agora mais baixo e eu não consigo acompanhar??? O que é isto??? Para conseguir manter o mesmo compasso, o esforço que passei a fazer era brutal, o que me provocava um cansaço muito grande.
Na última semana de Janeiro, estou eu de férias, quando as minhas “dobradiças” decidem acordar ao mesmo tempo, mãos inchadas, pulsos, pés, tornozelos e joelhos doridos, queria caminhar e não estava a ser capaz, aprendi a baloiçar o meu corpo para poder avançar, levantar da mesa, sentar, virar.
De manhã a primeira coisa que faço é abrir os estores do quarto para ver luz matinal, e de um momento para o outro não o conseguia fazer, passei à luz eléctrica, tinha a sensação que nem acordava em condições, levantar e ir preparar o pequeno almoço, passou a ser feito lentamente, o que já estava a mexer demasiado com o meu sistema nervoso, querer fazer as coisas e não estar a conseguir. Isto na primeira hora e meia da manha, depois lá passava durante o dia e quase conseguia repor alguma força, à noite lá decidiam voltar….
Entretanto as coisas foram piorando, no mês de Fevereiro fiquei a saber o que eram dores… definitivamente ate então não fazia ideia do que era… era a sensação que tinha..
A parte matinal de ficar “perra” passou a alongar-se ao dia todo, estava a tornar-me dependente para as coisas mais básicas para o ser humano…
Finalmente tive que dar o braço a torcer, e fui ao médico. Ele desconfiou pelos meus sintomas de Artrite Reumatóide (AR), fiz as 1ªas analisem e ela não gostou dos resultados, mandou-me repetir. Um dia vou buscar as análises e ate ter consulta, tinha que desvendar este mistério, abro a carta e vejo uns valores a vermelho…. MAU!!! Isto não pode ser coisa boa, como trabalho muito com internet, lá fui eu fazer algumas pesquisas…. Fico de “olhos em bico” com tanta informação e contra-informação, termos técnicos, decidi desligar o Pc e esperar pela consulta (ansiosa). Tenho consulta final de Fevereiro com a máxima de urgência: quando me diz para ter calma, que tenho k ser vista por um médico especialidade na área da reumatologia, íamos fazer um processo completo para não perder mais tempo e apresenta-me 2 soluções: ou hospital público e que vou ter que esperar que me chamem ou médico privado. Não aguento lista de espera agora, lá vai ter que ser privado. Passa-me uma carrada de exames e espero por eles todos para ir apresentar ao especialista.
Neste entretanto, eis que a minha saúde se debilita ainda mais, mas não deixo de ir trabalhar. Marco todos os exames e aguardo pelos resultados.
Para abrir uma simples garrafa de água tinha que pedir aos meus colegas, não tinha forças para fechar a mão. À noite passei a pedir ajuda para vestir o pijama, a conduzir fez me jeito o cruise controle nas rectas, nas curvas a coisa já era mais difícil, exigia um esforço enorme, a viagem que fazia em 10min, passou a ser feita em 25\30 min, os pés passaram a ter “picos”, era difícil só de caminhar. Ao sentar-me (no escritório ou na cozinha) o esforço passou a ser terrível, tinha de apoiar os cotovelos na mesa para fazer força no resto do corpo para me levantar.
As noites tornaram se um verdadeiro suplício, não tinha posição, virava-me de um lado para o outro, desejosa que a noite acabasse, e lá passava mais uma noite sem dormir. As febres passaram a ser uma constante, não passavam dos 38º, religiosamente todos os dias. Os suores nocturnos, em pleno inverno, a invasão das aftas, a perca de apetite e consequentemente peso, a visão sofreram algumas alterações, principalmente à noite, dificuldade em concentrar-me e memória fraca.
Sentia-me esgotadíssima, cansada, prestes a cair para o lado sem conseguir dominar-me, com o sentimento constante da perda de controlo dos meus próprios actos, de mim mesma.
Em Março foi me testado o meu limite máximo às dores.
04/03/2009 – faço o meu ultimo exame para o processo ficar completo e ir ao especialista.
05/03/2009 – dia do aniversário da minha mana mais nova. Não aguento mais. Arrasto-me de manha e ajudam-me a vestir, nem o botão consigo apertar. Agradeço às pessoas que sempre estivera, do meu lado mesmo quando refilava com o meu mau feitio, cheia de dores.
Entro no carro e lembro me de pensar: trabalho ou hospital? Dou por mim na entrada das urgências do hospital de Viseu, ás 10h da manhã, não dava mais. Sou consultada, fazem uma serio de exames, não faço ideia quais, pois já não estava em mim, parecia um zombie, um problema informático e os resultados não havia meio de saírem. Às 10h da noite sou informada que vou ser internada, quem eu? Eu só queria que me tirassem as dores, não preciso de mais nada, pensei eu, mas estava tão fora de mim, que para aí às tantas só pensei quero lá saber, livrem disto.
Levam-me de cadeiras de rodas para o quarto, dão me algumas drogas e eu acalmo e consigo adormecer, de manhã a sensação era outra, finalmente uma noite “dormida”. Ao fim de uns dias saio do hospital com: lepicortinol, arcoxia, plaquinol e pantoprazole, nem refilo, se o médico diz, eu obedeço…
Fui melhorando. Finais de Março tenho a 1ª consulta depois do internamento, o médico diz me que tudo indica AR, mas que ia passar a ser seguida no hospital por especialista, e assim foi.
No compasso da espera da dita consulta de especialidade, fui pesquisando o que era AR, fiz um dossier enorme, preparei uma lista de dúvidas para colocar ao médico na próxima visita, preparei uma pequena carta para associação de doentes dessa área, queria saber o que me esperava, como poderia ajudar-me a mim mesma, o que podia ou não fazer.
Algo começa a mudar em mim… o meu cabelo, começa a cair intensamente….
18/05/2009 – sai a consulta de reumatologia, 3 médicos à minha espera, como devem calcular fiquei alarmada. Levava a folha comigo e as perguntas todas na ponta da língua. Começam a ver as minhas analises, mexem nas minhas articulações, fui relatando os factos e os sintomas, entre eles trocas de olhar, linguagem quase codificada, e eu a olhar de um lado para o outro para ver se se lembravam que eu estava ali. Quando finalmente se decidem a falar comigo, diz me o médico: tenho uma boa e uma má notícia para si: a boa é que eu não tenho AR e a má é que eu tinha LÚPUS… acho que paralisei, perdi o norte, entrei em órbita, fiquei desorientada… por breves segundos, pergunto: do que é que estão a falar? O que se está a passar aqui? Onde é que eu estou? Fiquei sem chão… LÚPUS??? O que é que é isso afinal??? Lembro me de ter arrumado as folhas discretamente, foi das piores sensações que senti, tipo choque eléctrico.
A equipa tentou acalmar-me, não que estivesse me descontrolado fisicamente, mas a minha mente bloqueou, devo ter ficado de todas as cores… Tentarem explicar-me o que o LÚPUS, os cuidados a ter, ordem do dia: nada de sol, nada de praia, bla, bla, bla…. Já não conseguia ouvir mais nada, não me recordo de mais nada. Na minha mente voltou a bloquear nas 1ªs palavras, como??? Não posso apanhar sol?? Uma latina sem apanhar sol? Desculpem lá mas já tenho as minhas férias marcadas para a praia, estou a precisar de descanso, de ver o mar, não me podem fazer isso… alguém me acorda por favor….
Sai do hospital e estive sem falar com ninguém acerca disto, senti-me perdida, isolada, sozinha. Simplesmente não consegui is ao Google fazer uma simples pesquisa, passei uma fase de negação, só me apetecia chorar e desaparecer.
As falhas de cabelo eram cada vez maior, eu que tive sempre cabelo comprido, notava que as pessoas reparavam, mas também ninguém me dizia nada. Parece que falta uma parte de mim. Não aguentei ver a cara das pessoas “coitadinha” com sentimento de pena. Não queria mais isto, cheia de “peito” fui ao cabeleireiro pedi para cortar curto ou rapar mesmo, desatei a chorar sem conseguir controlar-me, ele lá me convenceu de que não seria necessário ser tão radical. Sai de lá com penteado à Beatriz Costa. O efeito foi pior, 8 dias depois compro um chapéu, volto lá e peço para ser mesmo curto desta vez. Lá sai eu com o cabelo super curto, mas o efeito que fez em mim, foi agradável, senti-me com forças para avançar, de nariz no ar, com vontade de dar um pontapé nesse “bicho”, com ganas de acabar com ele… foi incrível a sensação com que fiquei depois desse corte, uma nova etapa estava a começar… tolices minhas… e quando as pessoas me perguntavam alarmadas com o meu corte, punha o meu melhor sorriso e dizia que estava na altura de mudar de look… não voltei a sentir me “coitadinha”…
Sei que passei uma fase terrível e sabia que não era assim que queria continuar, ninguém gosta de nós, se nós não gostáramos de nós mesmas, por isso respirei fundo, pus um sorriso nos lábios, enchi o peito e segui em frente. Costumo dizer que depressa tão bem como de repente estou lá no fundo, mas tenho um bem… rapidamente volto ao de cima. E isso sim, tem me ajudado imenso, também tive muitas pessoas ao meu lado durante esse processo todo e nunca me humilharam, não fizeram grandes perguntas, respeitaram sempre o meu espaço, agradeço-lhes imenso.
Em Agosto desencadeia-se uma nova crise, continuo a ser medicada e consultada.
10/09/2009 – volto ás urgências pois voltei a paralisar com tantas dores. Sai do hospital perto das 3h da manha e sem as drogas me fazerem qualquer efeito. La fui para casa e aos poucos lá foi passando.
14/09/2009 – tenho marcado uma biopsia e fico internada 3 dias. Resultado: os meus rins estava afectados a 33%, estava na transição do nível III e IV, precisava de um tratamento diferente: apresentaram-me micofonelato de mofetil, quintipliquei a dose de lepicortinol, deixei a arcoxia.
Quando vou para casa e vejo a quantidade de medicação que tinha de passar a tomar, tive um pensamento, tenho que mudar alguma coisa. Estava com 50kg, não tinha apetite nenhum, comia muito pouco. Fui às compras, organizei os pequenos-almoços variados, para poder tomar aquelas bombas todas e proteger o meu estômago.
Passei a fazer 5 refeições, obriguei me a comer. Passagem de ano em Paris, e quando vejo as fotos fiquei assustada, quando cheguei a Portugal, fui me pesar, engordei 10kg em pouco mais de 3 meses, tinha o rosto tão inchado que metia confusão. Tentei controlar me na alimentação, pois o meu apetite tinha voltado com a força toda, dei por mim a comer uma caixa de manteiga sozinha. Tive que voltar a fazer um reajuste, ano foi fácil, mas lá consegui.
2010 – o meu médico estava satisfeito com os resultados, disse-me que o “bicho” estava em remissão, mas para estar atenta pois ele tem vida própria.
Até hoje não voltei a ter aquelas crises malucas, continuo a ser acompanhada por uma excelente equipa médica, principalmente pelo seu humanismo, a quem eu agradeço imenso.
Hoje já consigo falar sobre o assunto, já tenho feito algumas pesquisas, não conheço ninguém lúpico pessoalmente, há já algum tempo que sigo o blog de Tony Madureira e da Andreia, e agora no facebook acompanho mais perto algumas situações e onde já “conheço” mais pessoas (virtualmente) deste novo mundo lúpico… espero dentro em breve conhecer pessoalmente.
Ao ler alguns depoimentos, tenho a sensação que o LÚPUS tem sido meigo comigo, pois existem casos muito pior que o meu… não sei o que o futuro me espera, mas se voltar, sei que estou mais preparada e lhe vou dar luta…
Não podemos desistir, pois não? É o que temos de fazer… lutar… e com um sorriso no lábios… embora nem sempre seja fácil…
Uma questão: Existirá algum manual em que eu posso usar o lúpus e não ele a mim??? Faço constantemente essa pergunta… se houver alguma ideia..
Cumprimentos a todas…
Isabel Dias
Olá pessoal,
O meu nome é Isabel Dias, tenho 33 anos, sou de Viseu e tenho LES desde 2009.
A minha história é recente, sem muito para contar depois de ler outros testemunhos, mas vou contar um pouco…
Estou eu na entrada dos 30 anos com muitos sonhos, ilusões e algumas desilusões à mistura.
Não sei precisar datas certas, mas finais de 2008 começo com algumas dores estranhas, um cansaço que não conseguia explicar. Alias, explicava-as (na minha ignorância) com a falta de sono, más e desajustadas posições (que todos nos cometemos, mesmo tendo consciência delas), o facto de andar sob stress no trabalho…
As dores em algumas articulações ou “dobradiças” como tenho hábito de lhes chamar, estavam a ficar “empenadas”, na brincadeira dizia que era da idade. E como nunca gostei de ir ao médico, lá fui deixando arrastar. As dores andavam a saltitar de um lado para o outro: ora a mão direita, ora a mão esquerda, ora o pulso, ora os joelhos, ora os pés, ora os tornozelos e andavam elas de um lado para o outro, no máximo dos máximos 2 dias seguidos, nunca mais do que isso.
Não liguei, seria demasiado “mariquinhas” se não aguentasse estas simples dores, haviam de passar… dizia eu… é o que dá a mania de querer ser-se forte. Este é o sentimento que tenho dentro de mim, depois também aliado à falta de tempo que a própria vida nos obriga a ter, estamos tão absorvidos em projectos de vida na área profissional (principalmente), que não paramos para nos escutar-mos a nós próprias, e também não sabemos (eu) como interpretar esses sinais.
Novo ano começava – 2009 – e eu estava a entrar nela em cheio: 2 quistos sebáceos no rosto do lado direito, claro que já estava a dar sinais havia algum tempo, mas como não tenho “tempo a perder”, decidem chamar mesmo atenção e inflacionam, e o meu rosto fica uma vergonha, inchado, o olho esquerdo mal conseguia abrir, lá vai a Isabel para o hospital. Dias depois as minhas amigas amigdalites decidem dar o ar da sua graça, lá volta a Isabel a visitar as urgências, pois não estava a conseguir comer, este para mim é o ponto máximo, sem comer e com fome, para mim não dá, pois é das coisas que mais gosto de fazer.
Tendo em conta que até então (os 30) nunca tive nada de especial a registar ao nível da saúde, tirando amigdalites e sinusite (nada de muito grave). Nem a mim, nem a meus familiares, graças a Deus. Portanto problemas de saúde eram-me completamente alheios… nomes de doenças? Poucas… Causas? Nenhumas… Nomes de medicamentos? Paracetamol e pouco mais.
Foi então no inicio do novo ano (que já estava a ser muito interessante) que as dores começaram-se a intensificar e comecei a deixar de conseguir explicar as noites mal dormidas, queria caminhar e estava com dificuldades, porquê? O que se estava a passar??? Tenho 1,70m e 59kg (peso esse que deixou de ser normal dentro de pouco tempo), sempre tive o passo largo e caminhava rápido, eu é que tinha que esperar os outros para me acompanharem nas caminhadas, a coisa começou a ficar diferente, quando dou por mim, estou eu aos berros para irem mais devagar que não consigo ir mais rápido… pensei eu: calma lá, alguém mais alto do que eu tudo bem, agora mais baixo e eu não consigo acompanhar??? O que é isto??? Para conseguir manter o mesmo compasso, o esforço que passei a fazer era brutal, o que me provocava um cansaço muito grande.
Na última semana de Janeiro, estou eu de férias, quando as minhas “dobradiças” decidem acordar ao mesmo tempo, mãos inchadas, pulsos, pés, tornozelos e joelhos doridos, queria caminhar e não estava a ser capaz, aprendi a baloiçar o meu corpo para poder avançar, levantar da mesa, sentar, virar.
De manhã a primeira coisa que faço é abrir os estores do quarto para ver luz matinal, e de um momento para o outro não o conseguia fazer, passei à luz eléctrica, tinha a sensação que nem acordava em condições, levantar e ir preparar o pequeno almoço, passou a ser feito lentamente, o que já estava a mexer demasiado com o meu sistema nervoso, querer fazer as coisas e não estar a conseguir. Isto na primeira hora e meia da manha, depois lá passava durante o dia e quase conseguia repor alguma força, à noite lá decidiam voltar….
Entretanto as coisas foram piorando, no mês de Fevereiro fiquei a saber o que eram dores… definitivamente ate então não fazia ideia do que era… era a sensação que tinha..
A parte matinal de ficar “perra” passou a alongar-se ao dia todo, estava a tornar-me dependente para as coisas mais básicas para o ser humano…
Finalmente tive que dar o braço a torcer, e fui ao médico. Ele desconfiou pelos meus sintomas de Artrite Reumatóide (AR), fiz as 1ªas analisem e ela não gostou dos resultados, mandou-me repetir. Um dia vou buscar as análises e ate ter consulta, tinha que desvendar este mistério, abro a carta e vejo uns valores a vermelho…. MAU!!! Isto não pode ser coisa boa, como trabalho muito com internet, lá fui eu fazer algumas pesquisas…. Fico de “olhos em bico” com tanta informação e contra-informação, termos técnicos, decidi desligar o Pc e esperar pela consulta (ansiosa). Tenho consulta final de Fevereiro com a máxima de urgência: quando me diz para ter calma, que tenho k ser vista por um médico especialidade na área da reumatologia, íamos fazer um processo completo para não perder mais tempo e apresenta-me 2 soluções: ou hospital público e que vou ter que esperar que me chamem ou médico privado. Não aguento lista de espera agora, lá vai ter que ser privado. Passa-me uma carrada de exames e espero por eles todos para ir apresentar ao especialista.
Neste entretanto, eis que a minha saúde se debilita ainda mais, mas não deixo de ir trabalhar. Marco todos os exames e aguardo pelos resultados.
Para abrir uma simples garrafa de água tinha que pedir aos meus colegas, não tinha forças para fechar a mão. À noite passei a pedir ajuda para vestir o pijama, a conduzir fez me jeito o cruise controle nas rectas, nas curvas a coisa já era mais difícil, exigia um esforço enorme, a viagem que fazia em 10min, passou a ser feita em 25\30 min, os pés passaram a ter “picos”, era difícil só de caminhar. Ao sentar-me (no escritório ou na cozinha) o esforço passou a ser terrível, tinha de apoiar os cotovelos na mesa para fazer força no resto do corpo para me levantar.
As noites tornaram se um verdadeiro suplício, não tinha posição, virava-me de um lado para o outro, desejosa que a noite acabasse, e lá passava mais uma noite sem dormir. As febres passaram a ser uma constante, não passavam dos 38º, religiosamente todos os dias. Os suores nocturnos, em pleno inverno, a invasão das aftas, a perca de apetite e consequentemente peso, a visão sofreram algumas alterações, principalmente à noite, dificuldade em concentrar-me e memória fraca.
Sentia-me esgotadíssima, cansada, prestes a cair para o lado sem conseguir dominar-me, com o sentimento constante da perda de controlo dos meus próprios actos, de mim mesma.
Em Março foi me testado o meu limite máximo às dores.
04/03/2009 – faço o meu ultimo exame para o processo ficar completo e ir ao especialista.
05/03/2009 – dia do aniversário da minha mana mais nova. Não aguento mais. Arrasto-me de manha e ajudam-me a vestir, nem o botão consigo apertar. Agradeço às pessoas que sempre estivera, do meu lado mesmo quando refilava com o meu mau feitio, cheia de dores.
Entro no carro e lembro me de pensar: trabalho ou hospital? Dou por mim na entrada das urgências do hospital de Viseu, ás 10h da manhã, não dava mais. Sou consultada, fazem uma serio de exames, não faço ideia quais, pois já não estava em mim, parecia um zombie, um problema informático e os resultados não havia meio de saírem. Às 10h da noite sou informada que vou ser internada, quem eu? Eu só queria que me tirassem as dores, não preciso de mais nada, pensei eu, mas estava tão fora de mim, que para aí às tantas só pensei quero lá saber, livrem disto.
Levam-me de cadeiras de rodas para o quarto, dão me algumas drogas e eu acalmo e consigo adormecer, de manhã a sensação era outra, finalmente uma noite “dormida”. Ao fim de uns dias saio do hospital com: lepicortinol, arcoxia, plaquinol e pantoprazole, nem refilo, se o médico diz, eu obedeço…
Fui melhorando. Finais de Março tenho a 1ª consulta depois do internamento, o médico diz me que tudo indica AR, mas que ia passar a ser seguida no hospital por especialista, e assim foi.
No compasso da espera da dita consulta de especialidade, fui pesquisando o que era AR, fiz um dossier enorme, preparei uma lista de dúvidas para colocar ao médico na próxima visita, preparei uma pequena carta para associação de doentes dessa área, queria saber o que me esperava, como poderia ajudar-me a mim mesma, o que podia ou não fazer.
Algo começa a mudar em mim… o meu cabelo, começa a cair intensamente….
18/05/2009 – sai a consulta de reumatologia, 3 médicos à minha espera, como devem calcular fiquei alarmada. Levava a folha comigo e as perguntas todas na ponta da língua. Começam a ver as minhas analises, mexem nas minhas articulações, fui relatando os factos e os sintomas, entre eles trocas de olhar, linguagem quase codificada, e eu a olhar de um lado para o outro para ver se se lembravam que eu estava ali. Quando finalmente se decidem a falar comigo, diz me o médico: tenho uma boa e uma má notícia para si: a boa é que eu não tenho AR e a má é que eu tinha LÚPUS… acho que paralisei, perdi o norte, entrei em órbita, fiquei desorientada… por breves segundos, pergunto: do que é que estão a falar? O que se está a passar aqui? Onde é que eu estou? Fiquei sem chão… LÚPUS??? O que é que é isso afinal??? Lembro me de ter arrumado as folhas discretamente, foi das piores sensações que senti, tipo choque eléctrico.
A equipa tentou acalmar-me, não que estivesse me descontrolado fisicamente, mas a minha mente bloqueou, devo ter ficado de todas as cores… Tentarem explicar-me o que o LÚPUS, os cuidados a ter, ordem do dia: nada de sol, nada de praia, bla, bla, bla…. Já não conseguia ouvir mais nada, não me recordo de mais nada. Na minha mente voltou a bloquear nas 1ªs palavras, como??? Não posso apanhar sol?? Uma latina sem apanhar sol? Desculpem lá mas já tenho as minhas férias marcadas para a praia, estou a precisar de descanso, de ver o mar, não me podem fazer isso… alguém me acorda por favor….
Sai do hospital e estive sem falar com ninguém acerca disto, senti-me perdida, isolada, sozinha. Simplesmente não consegui is ao Google fazer uma simples pesquisa, passei uma fase de negação, só me apetecia chorar e desaparecer.
As falhas de cabelo eram cada vez maior, eu que tive sempre cabelo comprido, notava que as pessoas reparavam, mas também ninguém me dizia nada. Parece que falta uma parte de mim. Não aguentei ver a cara das pessoas “coitadinha” com sentimento de pena. Não queria mais isto, cheia de “peito” fui ao cabeleireiro pedi para cortar curto ou rapar mesmo, desatei a chorar sem conseguir controlar-me, ele lá me convenceu de que não seria necessário ser tão radical. Sai de lá com penteado à Beatriz Costa. O efeito foi pior, 8 dias depois compro um chapéu, volto lá e peço para ser mesmo curto desta vez. Lá sai eu com o cabelo super curto, mas o efeito que fez em mim, foi agradável, senti-me com forças para avançar, de nariz no ar, com vontade de dar um pontapé nesse “bicho”, com ganas de acabar com ele… foi incrível a sensação com que fiquei depois desse corte, uma nova etapa estava a começar… tolices minhas… e quando as pessoas me perguntavam alarmadas com o meu corte, punha o meu melhor sorriso e dizia que estava na altura de mudar de look… não voltei a sentir me “coitadinha”…
Sei que passei uma fase terrível e sabia que não era assim que queria continuar, ninguém gosta de nós, se nós não gostáramos de nós mesmas, por isso respirei fundo, pus um sorriso nos lábios, enchi o peito e segui em frente. Costumo dizer que depressa tão bem como de repente estou lá no fundo, mas tenho um bem… rapidamente volto ao de cima. E isso sim, tem me ajudado imenso, também tive muitas pessoas ao meu lado durante esse processo todo e nunca me humilharam, não fizeram grandes perguntas, respeitaram sempre o meu espaço, agradeço-lhes imenso.
Em Agosto desencadeia-se uma nova crise, continuo a ser medicada e consultada.
10/09/2009 – volto ás urgências pois voltei a paralisar com tantas dores. Sai do hospital perto das 3h da manha e sem as drogas me fazerem qualquer efeito. La fui para casa e aos poucos lá foi passando.
14/09/2009 – tenho marcado uma biopsia e fico internada 3 dias. Resultado: os meus rins estava afectados a 33%, estava na transição do nível III e IV, precisava de um tratamento diferente: apresentaram-me micofonelato de mofetil, quintipliquei a dose de lepicortinol, deixei a arcoxia.
Quando vou para casa e vejo a quantidade de medicação que tinha de passar a tomar, tive um pensamento, tenho que mudar alguma coisa. Estava com 50kg, não tinha apetite nenhum, comia muito pouco. Fui às compras, organizei os pequenos-almoços variados, para poder tomar aquelas bombas todas e proteger o meu estômago.
Passei a fazer 5 refeições, obriguei me a comer. Passagem de ano em Paris, e quando vejo as fotos fiquei assustada, quando cheguei a Portugal, fui me pesar, engordei 10kg em pouco mais de 3 meses, tinha o rosto tão inchado que metia confusão. Tentei controlar me na alimentação, pois o meu apetite tinha voltado com a força toda, dei por mim a comer uma caixa de manteiga sozinha. Tive que voltar a fazer um reajuste, ano foi fácil, mas lá consegui.
2010 – o meu médico estava satisfeito com os resultados, disse-me que o “bicho” estava em remissão, mas para estar atenta pois ele tem vida própria.
Até hoje não voltei a ter aquelas crises malucas, continuo a ser acompanhada por uma excelente equipa médica, principalmente pelo seu humanismo, a quem eu agradeço imenso.
Hoje já consigo falar sobre o assunto, já tenho feito algumas pesquisas, não conheço ninguém lúpico pessoalmente, há já algum tempo que sigo o blog de Tony Madureira e da Andreia, e agora no facebook acompanho mais perto algumas situações e onde já “conheço” mais pessoas (virtualmente) deste novo mundo lúpico… espero dentro em breve conhecer pessoalmente.
Ao ler alguns depoimentos, tenho a sensação que o LÚPUS tem sido meigo comigo, pois existem casos muito pior que o meu… não sei o que o futuro me espera, mas se voltar, sei que estou mais preparada e lhe vou dar luta…
Não podemos desistir, pois não? É o que temos de fazer… lutar… e com um sorriso no lábios… embora nem sempre seja fácil…
Uma questão: Existirá algum manual em que eu posso usar o lúpus e não ele a mim??? Faço constantemente essa pergunta… se houver alguma ideia..
Cumprimentos a todas…
Isabel Dias